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Horizonte da Cena

Horizonte da Cena

Daniel Toledo

coberturas críticas

Rios de carne, osso e poesia

Rios de carne, osso e poesia

— por Daniel Toledo —

Crítica do espetáculo “A cidade dos rios invisíveis”, do coletivo Estopô Balaio (de) Criação, Memória e Narrativa.

Por baixo do cimento que reveste boa parte das grandes cidades brasileiras, rios invisíveis correm, como podem, em direção ao mar. Muitas vezes deslocados de seus leitos naturais, tais rios ganham, sob a superfície da cidade, fisionomias que em muito se diferem das nascentes que, perto ou longe dali, lhes dão origem. E quanto menor é o leito, quanto maior é a impermeabilização, mais forte se torna a correnteza desses rios, que sobrevivem contra tudo e contra todos, em busca de um mar que, no meio ou no fim da história, lhes possa acolher.

Sobre o mesmo cimento que endurece e impermeabiliza as grandes cidades, correm outros rios. Às vezes feitos de metal, correndo sobre trilhos que conectam os centros às periferias. Às vezes feitos de carne e osso, correndo fortes, ainda que cansados, em longos trajetos que ligam a casa e o trabalho, deixando pouco tempo para aspectos da existência que ultrapassem a mera e árdua luta pela sobrevivência. É sobre todos esses rios, ao que parece, que se constitui o espetáculo “A cidade dos rios invisíveis”, realizado pelo coletivo Estopô Balaio (de) Criação, Memória e Narrativa, com sede no bairro Jardim Romano, na Zona Leste São Paulo.

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Construído a partir de um longo diálogo entre moradores do bairro e artistas que há cinco anos o escolheram como território de trabalho e inspiração, o espetáculo começa em uma estação de trem situada no centro da capital paulista. Nessa estação, somos convidados a embarcar numa viagem em direção à periferia da cidade, onde se concentram muitos daqueles que apostam nos centros urbanos como destino após deixarem para trás suas nascentes. Damos início, então, a uma clara operação de deslocamento, tanto em relação às protegidas salas geralmente associadas ao acontecimento teatral, quanto à própria vivência da cidade.

Ao longo de mais ou menos 40 minutos, somos estimulados a experimentar a viagem como uma experiência estética, sensorial e repleta de sentidos, embalada por uma contínua peça sonora a que temos acesso por meio de fones de ouvido distribuídos no início do espetáculo. Estruturada a partir de uma complexa composição entre canções, narrações poéticas, sons de rio e depoimentos de moradores do bairro Jardim Romano, a peça se vale de simultaneidades e justaposições para estimular no espectador uma atitude ao mesmo tempo atenta e relaxada, capaz de converter em experiência e vida o tempo geralmente “perdido” no transporte público.

Como um dos eixos dessa peça sonora, figura a saga dos “pequenos deuses” que habitam as periferias das cidades, continuamente criando e recriando seus espaços de vida. Enquanto parte dessas narrativas chama atenção pelo lirismo com que trata a vivência da periferia, outra parcela apresenta de modo direto os desafios enfrentados pelos moradores dessas comunidades, dentre os quais ganham destaque a difícil convivência com chuvas e enchentes.

Estimulados pelo que ouvimos e também pelo que vemos através das janelas do trem, lembramos que as cidades estão em permanente construção. Seguindo o curso do rio de metal, percebemos ao redor tanto pequenas casas de alvenaria construídas com as próprias mãos quanto conjuntos habitacionais que, sob o ritmo acelerado do trem, por vezes se assemelham a complexos penitenciários. Ao longo do caminho, também há espaço para alguns respiros verdes na paisagem, assim como para estruturas industriais abandonadas cujas dimensões criam um potente contraste em relação às habitáveis “caixas de fósforo” que vemos em diversos pontos do trajeto.

Ao chegar na estação Jardim Romano, no entanto, deixamos de ver a cidade à distância e passamos a fazer parte dela. Atores e espectadores formam, então, um mesmo rio, no qual pouco a pouco desembocam outros cursos d’água. Resultado de uma colaboração entre atores “estrangeiros” que conduzem a viagem de trem e atores “nativos” que nos recebem no bairro, o espetáculo propõe, daí em diante, uma espécie de cortejo por ruas e becos da comunidade, tendo como destino final o rio que delimita a outra margem do bairro. Devido à forte chuva que caía no dia da apresentação que gerou esta crítica, entretanto, foi necessário adaptar o espetáculo à área externa da sede do coletivo, onde nos acomodamos, juntos, em uma espécie de sarau.

A partir de procedimentos relacionados ao teatro documentário, somos brevemente introduzidos pelo diretor do espetáculo, João Júnior, a fragmentos de histórias de diferentes moradores do bairro, os quais deixam fluir suas correntezas em nossa direção. Donos de suas próprias narrativas, tais moradores nos apresentam, por meio de poesias, músicas, performances e breves cenas teatrais, realidades marcadas pela resistência aos caprichos do capital e das grandes cidades, assim como pela lida com uma natureza que sazonalmente reivindica seu espaço.

À problemática convivência com chuvas e enchentes, inicialmente apresentada como eixo central do espetáculo, novas camadas temáticas se acrescentam, como, por exemplo, a migração de nordestinos para as periferias da capital paulista. Imersos em uma encenação que ganha força à medida em que revela seu extracampo, nos tornamos, a cada instante, mais integrados ao contexto social que nos recebe. Ali o orgulho se sobrepõe à opressão, assim como uma inegável sensação de pertencimento parece compensar os deslocamentos – geográficos e sociais – comuns aos participantes do acontecimento teatral e performático paulatinamente constituído entre atores e espectadores.

Reiterando, na poesia e na prática, a força da vizinhança e do senso de comunidade entre aqueles que habitam as periferias e regiões mais pobres de qualquer cidade, nos percebemos, pouco a pouco, como parte de um leito simbólico por onde vigorosos rios invisíveis, daqueles feitos de carne, osso e poesia, podem, enfim, correr e desaguar num mar de sentidos e sentimentos que, sempre vale lembrar, são comuns a todos nós.

(Texto escrito no âmbito da IX Mostra Latino-Americana de Teatro de Grupo. A organização convidou a DocumentaCena – Plataforma de Críticos para a cobertura do festival, iniciativa que envolve os espaços digitais Horizonte da Cena, Satisfeita, Yolanda?, Questão de Crítica e Teatrojornal.)

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10/11/2015 TAGS: Coletivo Estopô Balaio (de) Criação, Mostra Latino-Americana de Teatro de Grupo BY: Daniel Toledo
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Entre o excesso e a escassez

Entre o excesso e a escassez

— por Daniel Toledo —

Crítica do espetáculo “Condomínio Nova Era”, d’A Digna Companhia (SP).

Seja em São Paulo, Natal, Belo Horizonte ou qualquer outra grande cidade brasileira, são bastante claros e expressivos os efeitos da especulação imobiliária sobre o direito à moradia, garantido pela Constituição de 1988 a todos nós. Diante de um contexto político e econômico que favorece a concentração de terrenos e imóveis nas mãos de poucos, não é de se estranhar o crescente número de moradores de rua nessas cidades, assim como o grande contingente de pessoas que precisam se submeter a condições de moradia que em muito se diferem das estipuladas pela nossa Constituição.

Interessado em explorar essa contradição nacional e inspirado pela experiência de viver durantes alguns meses em uma precária pensão no centro de São Paulo, o dramaturgo Victor Nóvoa escreveu, em 2013, a peça “Condomínio Nova Era”. Montada no ano seguinte por A Digna Companhia, da qual o autor faz parte, a peça tem direção de Rogério Tarifa, trazendo alguns cortes e acréscimos em relação ao texto original.

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Conduzida por seis personagens que tocam suas vidas em um mesmo edifício, a montagem convida o público a acompanhá-los nos momentos que antecedem a desocupação do prédio, após a compra do terreno por uma grande construtora. Como em uma visita aos últimos instantes dessa pequena comunidade, conhecemos cada um dos personagens em seus improvisados ambientes de vida, construídos ante os olhos do público a partir de tapumes, tecidos, antigos eletrodomésticos e incontáveis objetos que inundam a cena. Já se estabelece, a partir de então, um contraste entre o excesso visual que permeia a encenação e a escassez de recursos sugerida pelo contexto que lhe serve como inspiração.

Combinando monólogos direcionados ao público e cenas dramáticas realizadas por duplas de atores, a primeira parte do espetáculo nos oferece retratos mais ou menos breves de cada um dos personagens, suas aspirações e condições de vida. Certo tom de lamento predomina entre os relatos, aos poucos contaminando as relações entre atores e público. Apresentados como fracos, frustrados e fracassados, os personagens pouco deixam ver outras qualidades que poderiam surgir como contraponto e lhes atribuir a devida complexidade. Lançando mão de personagens bastante típicos, tais quais o homem violento, a mulher submissa e o homossexual cômico, o desenvolvimento da história lhes reserva poucas surpresas, como se negasse a possibilidade de transformação e ressignificação da existência.

Às vezes tratados como moradores ou visitantes do condomínio, outras, como se uma quarta parede nos separasse da cena, testemunhamos, num segundo momento da montagem, o acréscimo de um terceiro caminho de fruição. Ao serem informados de que serão despejados do edifício, os personagens se reúnem em um mesmo espaço e de algum modo se mesclam aos seus intérpretes, oferecendo ao público discursos críticos que tratam, entre outras coisas, de opressões de gênero e classe. A esses discursos é adicionada ainda a voz do próprio diretor do espetáculo, que irrompe a encenação para expor ao público dilemas e questões relativos à prática artística.

Chegamos, aí, à última parte do espetáculo, quando um novo personagem passa a mobilizar a história. Representando os interesses do capital sobre a cidade, trata de forma escarnecedora os moradores do condomínio, acrescentando mais um tipo conhecido à alegórica paisagem social construída pela encenação. Num embate em que a raiva e a violência se sobrepõem a outras possibilidades de relação, testemunhamos mais um momento de excessos, no qual uma sucessão de casos de violência são, como numa lista, textualmente apresentados ao público. O excesso visual contamina, então, o próprio texto da peça, deixando pouco espaço simbólico a ser percorrido pelo espectador.

Talvez por reunir, em cena, um excesso de elementos, imagens e discussões, o espetáculo “Condomínio Nova Era” acaba, em alguns momentos, apenas reproduzindo uma situação que visava criticar. Apesar de oferecer ao público uma experiência teatral ousada e repleta de singularidades estéticas, o trabalho parece encontrar limites ao propôr situações e personagens demasiado estereotipados, enfraquecendo seu diálogo com o contexto contemporâneo e os deslocamentos políticos que o caracterizam. Apoiando-se em tipos conhecidos, assim como em uma visão excessivamente dicotômica sobre o conflito que lhe serve como eixo, deixa dúvidas sobre a capacidade de desestabilizar uma visão simplista em relação ao relevante e complexo fenômeno social que se propõe a problematizar.

(Texto escrito no âmbito da IX Mostra Latino-Americana de Teatro de Grupo. A organização convidou a DocumentaCena – Plataforma de Críticos para a cobertura do festival, iniciativa que envolve os espaços digitais Horizonte da Cena, Satisfeita, Yolanda?, Questão de Crítica e Teatrojornal.)

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10/11/2015 TAGS: A Digna Companhia, Mostra Latino-Americana de Teatro de Grupo BY: Daniel Toledo
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Táticas de visibilidade e reinvenção

Táticas de visibilidade e reinvenção

— por Daniel Toledo —

Crítica do espetáculo “Página 469”, do Grupo Teatral Engasga Gato (Ribeirão Preto/SP).

 

Estamos na Praça Roosevelt, em São Paulo. Nos aproximamos do fim do expediente, e o movimento da região começa a aumentar. Enquanto algumas pessoas deixam o trabalho, outras se acomodam nos bares do entorno. Como de costume, grupos de jovens invadem diferentes pontos da praça, ao mesmo tempo em que alguns moradores de rua – às vezes solitários, às vezes não – encontram nela um espaço propício a ser habitado, sabe-se lá por quê e por quanto tempo. Reunidos em um mesmo lugar, simultaneamente de todos e de nenhum deles, tais personagens experimentam a praça como um contexto onde se pode viver, em público, capítulos de trajetórias particulares. Tudo corre conforme o costume – como se nada, na verdade, acontecesse ali.

Mas a praça recebe, nesse mesmo fim de tarde, alguns elementos que intrigam seus frequentadores. Afixadas às grades de uma trincheira que a tangencia, há fotografias que se apropriam da escala humana e imediatamente remetem a moradores de rua protegidos com casacos e cobertores. Do outro lado da rua, descansam sobre a calçada alguns corpos de papel machê, gerando nos transeuntes uma curiosidade que os corpos de carne e osso, igualmente espalhados aqui e ali, parecem já não ser capazes de despertar. Tão sutis quanto os bonecos de papel machê, outros corpos silenciosamente se inscrevem no mesmo espaço. Usando giz branco, se apropriam do acinzentado piso da praça como página a ser ocupada com reflexões e histórias que não encontram ouvido entre as apressadas pessoas que transitam pela cidade.

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É em meio a essa paisagem, na qual arte e vida intencionalmente se misturam, que tem início o espetáculo “Página 469”. Realizado pelo Grupo Teatral Engasga Gato, com texto de André Felipe e direção do veterano artista e pesquisador André Carreira, o trabalho é movido pela busca de Getúlio, um funcionário público que misteriosamente abandonou seu posto e, até onde sabemos, passou a viver na rua. Sob o comando de três atrapalhados funcionários de uma curiosa “Liga do Bem”, a busca rapidamente mobiliza espectadores e passantes, envolvendo-nos num bem-humorado jogo de erros e acertos que, entre linhas de visibilidade e invisibilidade, conduzem ao até então desaparecido Getúlio.

A partir desse encontro, o humor quase farsesco que predominava no início da peça se funde a um drama naturalista que remete a trabalhadores confinados em paletós, escritórios e vidas sem sentido. Como contraponto ao peso de tais enquadramentos, tão familiares a todos nós, a rua é apresentada como arena onde cada um, inclusive Getúlio, tem liberdade para reescrever a própria história. Enquanto nosso protagonista decide se volta ou não a vestir seu antigo paletó, somos convocados a olhar ao redor, imaginando as histórias de todos aqueles que, seja por circunstância ou escolha, abrem mão dos próprios passados e encontram na rua a possibilidade de se reinventar.

Enquanto alguns desses corpos reinventados estabelecem a rua como destino final, outros, como Getúlio, são obrigados a confrontar histórias passadas, deparando-se com um contexto em que a luta pela liberdade é frequentemente tratada como loucura. Devolvidos, então, a um sistema que não lhes cabe, deixam pra trás histórias escritas pela metade, assim como casas imaginárias e afetos concretos, construídos em público, no seio da cidade.

Superando visão que trata a cidade como mero ponto de passagem, “Página 469” defende o espaço público como palco de histórias e personagens que estamos acostumados a não enxergar. Oferece-se como acontecimento público, no qual mesmo dramas tipicamente burgueses ganham novos significados e sentidos sociais.

Ao converter uma praça em sala de casa, converte também um drama supostamente íntimo em questão de interesse coletivo, reativando um senso de comunidade que muitas vezes se perde nos grandes centros urbanos. E findo o espetáculo de características nada espetaculares, nos deparamos com uma cidade de silêncios profundos, adensados por personagens reais, agora muito mais visíveis, e dezenas de outras histórias que, ao menos por enquanto, ainda não nos foram contadas.

(Texto escrito no âmbito da IX Mostra Latino-Americana de Teatro de Grupo. A organização convidou a DocumentaCena – Plataforma de Críticos para a cobertura do festival, iniciativa que envolve os espaços digitais Horizonte da Cena, Satisfeita, Yolanda?, Questão de Crítica e Teatrojornal.)

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De volta à sala de aula

De volta à sala de aula

—  por Daniel Toledo —

Crítica do espetáculo “Ledores no Breu”, da Cia. do Tijolo (SP).

Há quem saiba ler as palavras, mas não o mundo. Há quem saiba ler o mundo, mas não as palavras. É sobre premissas como essas que se constitui o espetáculo “Ledores no Breu”, realizado pela Cia. do Tijolo a partir de materiais tão diversos quanto a prática pedagógica do educador Paulo Freire e a produção poética do alfaiate Zé da Luz. Conduzida pelo ator pernambucano Dinho Lima Flor sob a direção de Rodrigo Mercadante, a montagem chama atenção às contradições que permeiam a noção de analfabetismo, ampliando seus significados e atribuindo-lhe uma complexidade que muitas vezes nos escapa.

A partir de uma dramaturgia que combina música, poesia, diálogos diretos com o público e uma sucessão de poéticas narrativas guiadas por personagens em processo de alfabetização, temos acesso a um universo em que os sentidos não são dados de antemão, mas construídos em cena, não raro por meio de exercícios pedagógicos ali convertidos em instantes performáticos que convocam a participação do espectador.

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Habitado por cadeiras escolares, grandes rolos de papel em branco e alguns pedaços de carvão, o palco remete a uma improvisada sala de aula, revelando, decerto, uma escala mais adequada a adultos que a crianças. Aos poucos, entretanto, essa sala de aula se expande em direção ao público, e nos imbricamos, de fato, em exercícios de leitura, escrita e aprendizado, a exemplo das turmas conduzidas por Paulo Freire e das numerosas escolas para jovens e adultos que, mesmo na surdina e sem grandes incentivos, já há algum tempo vêm transformando a paisagem social brasileira. Segundo dados de 2014, no entanto, ainda passa de 13 milhões o numero de analfabetos no país.

Nina, Paraíba e Brasil são algumas das palavras que, da plateia, reaprendemos a ler e interpretar. Aprendemos também que, se não há caderno, a terra e o corpo podem servir como superfície de escrita. E para além das letras e sílabas que já conhecemos, as palavras ganham, em “Ledores no Breu”, significados profundos que remontam a experiências e histórias em que aspectos pessoais e sociais frequentemente se imbricam. Por meio de narrativas que tocam em temas caros à realidade brasileira, tais quais o machismo, a reforma agrária, o êxodo rural e a grave desigualdade social – e educacional – que nos acompanha desde sempre, a montagem nos convida a percorrer um caminho político e poético em direção aos múltiplos sentidos das palavras.

Tratadas, ali, como possíveis instrumentos de poder e emancipação, as palavras, sejam escritas ou faladas, ganham ainda outros significados. É por meio delas, afinal, que se constroem memórias, expurgos e confissões. Também apoiam-se nas palavras as falsas promessas, os legítimos protestos e uma série de mecanismos de distinção social dos quais somos, recorrentemente, vítimas e algozes. E quando as palavras correspondem a meros enigmas, tais como as pinturas rupestres aos olhos de boa parte de nós, o não saber é defendido como campo de abertura para a criatividade e a invenção de sentidos, por vezes mais pertinentes e certeiros do que os encontrados no dicionário.

Aprendemos, ainda, que não somente as palavras nos desafiam à leitura, mas também o céu, as cidades, as linhas das mãos e a própria realidade social. Superando em muito o sentido mais óbvio do analfabetismo, que se refere à incapacidade de ler e escrever palavras, o trabalho nos convoca a pensar sobre outros analfabetismos dos nossos tempos, decerto tão ou mais graves que o primeiro, relacionados, por exemplo, aos campos ético, estético, político e afetivo.

Definido pelo próprio intérprete como um espetáculo para “cutucar a pátria”, “Ledores no Breu” convida o público a retornar à sala de aula e visitar os próprios analfabetismos, afirmando, em certo sentido, a impossibilidade contemporânea do drama burguês e de qualquer obra teatral que disponha o espectador ante uma cena da qual tenha a impressão de não fazer parte. Estamos todos no escuro, afinal, e cabe a cada um de nós encontrar luzes que possam indicar um novo caminho para a sociedade que, a cada dia, construímos juntos.

(Texto escrito no âmbito da IX Mostra Latino-Americana de Teatro de Grupo. A organização convidou a DocumentaCena – Plataforma de Críticos para a cobertura do festival, iniciativa que envolve os espaços digitais Horizonte da Cena, Satisfeita, Yolanda?, Questão de Crítica e Teatrojornal.)

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10/11/2015 TAGS: Cia. do Tijolo, Mostra Latino-Americana de Teatro de Grupo BY: Daniel Toledo
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coberturas

Curadores do FIT-BH renunciam aos cargos

Curadores do FIT-BH renunciam aos cargos

— Por Joyce Athie —

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Os artistas Diego Bagagal, do grupo Madame Teatro, e Eduardo Moreira, do Grupo Galpão, divulgaram ontem carta de renúncia aos cargos de curadores da próxima edição do Festival Internacional de Teatro – Palco & Rua (FIT -BH 2016). A decisão foi tomada em função de incompatibilidade com a produção do evento, assumida pela Fundação Municipal de Cultura (FMC) e coordenada por Cássio Pinheiro.

Ao lado de Bagagal e Eduardo, o dramaturgo, ator e diretor Walmir José também integra a equipe original de curadores, anunciada em janeiro deste ano pela FMC. Nos últimos dois meses, no entanto, a atriz e diretora Dayse Belico foi convidada pela instituição a fazer parte do grupo de curadores, quando a pré-produção já estava quase finalizada. Após Bagagal e Moreira renunciarem aos postos, Walmir e Dayse permanecem na curadoria com a missão de prosseguir com o festival, previsto para acontecer em junho de 2016.

Dayse e Walmir, no entanto, tem um consistente ponto de partida. Após viagens a festivais de teatro, em especial na Europa, os curadores já haviam chegado a uma lista de espetáculos e atividades formativas, entregue à produção do festival. Bagagal e Moreira, no entanto, se sentiram inseguros quanto à capacidade da FMC de produzir o festival com a grade proposta, uma vez que o orçamento do FIT, da ordem de R$ 5,5 mi, será liberado apenas em janeiro de 2016. Apenas a partir desta data, a Fundação irá dar início à produção do festival, procedendo ao contato com os grupos e artistas selecionados.

A prazo para a liberação da verba e, portanto, para o início da produção, pode impactar no trabalho de curadoria que vem sendo realizado com antecedência, desde cerca de um ano e cinco meses antes da data prevista para o festival acontecer. “O grande problema é que, sem uma estrutura de produção rápida e eficiente, todo o projeto se encontra ameaçado. Qualquer grupo renomado na Europa e nos Estados Unidos já está com as agendas bem carregadas para 2016. Nossa urgência maior é com relação aos grupos internacionais, uma vez que a produção para efetivar a vinda desses grupos é evidentemente muito mais complexa”, defendem os curadores por email.

Antes da renúncia, no entanto, Bagagal e Moreira finalizaram os acordos realizados com a FMC e entregaram ao órgão os conceitos que constituiriam as bases da edição 2016 do festival. Guiados pela noção de resiliência, os curadores buscaram espetáculos que dialogam com a capacidade de resistência do humano que se constrói a partir da alteridade, em uma proposta que se marca pela multiplicidade e diversidade. E quanto aos valores buscados, parece que não houve qualquer dificuldade em aprovação.

“O nosso projeto foi aceito integralmente. Não houve nenhum tipo de discordância com relação ao conceito curatorial. Tivemos ampla liberdade para pensar e propor um conceito ligado ao teatro como lugar de resistência. As discordâncias se devem a uma carência de estrutura por parte da Fundação, especialmente ligada às relações internacionais, que colocam em risco todo um enorme esforço empreendido”, afirmam.

Programação. Por meio de nota, a FMC comunica que prosseguirá com a produção do festival a partir do que foi apresentado pelos curadores e afirma que irá buscar “por perfis de espetáculos não contemplados na proposta entregue, como peças de rua, infantis e de grupos locais, além de atividades de ações formativas”.

Diante do comunicado, os curadores divulgaram a grade de programação que haviam proposto, ressaltando que algumas mudanças poderiam ser realizadas. Em relação ao teatro de rua, a grade apresenta três produções, as internacionais “Animotion Show”, do Aurora Nova, e “L’enterrement de maman”, da Cia Cacahuête, e a nacional “Eu não sou macaco”, de Dedy Ricardo. Ainda para o público infanto-juvenil, os curadores selecionaram outros três espetáculos: o australiano “Knee Deep”, o americano “Doctor Brown” e ainda “Infinita”, do grupo alemão Familie Floz, destacado por utilizar máscaras expressivas inteiras. A respeito das ações formativas, estava pré-acordada a realização de Master Classes, colóquios e ateliês com doze dos grupos que compõem a grade.

O ponto fulcral parece estar no que tange a produção belo-horizontina.“A programação local foi pensada, neste primeiro momento, em ações de extensão, residências de grupos locais com os grupos convidados e co-produções. Basicamente, queremos efetivar e potencializar o diálogo e o encontro entre os artistas”, expõe Bagagal.

Até o momento, a programação consta de 23 espetáculos de companhias internacionais e 11 nacionais, duas co-produções e nenhum espetáculo da cidade. Em termos numéricos, haveria uma redução no porte do FIT – na edição anterior, o festival apresentou, em 20 dias, 54 espetáculos, sendo 18 produções internacionais, 12 nacionais e 25 locais. O aumento quantitativo, no entanto, foi alvo de críticas em relação à qualidade dos espetáculos e à quantidade de produções locais não-estreantes. O que se nota na proposta apresentada para o FIT 2016 é uma radicalização desse formato, embora os curadores afirmem que haveria possibilidade de convidar grupos e artistas belo-horizontinos a integrar a grade. Atores belo-horizontinos também seriam incorporados em trabalhos como a performance “No place to hide”, do Living Theater, e o polêmico “Exhibit B”, de Brett Bailey, que vem recebendo ações de boicote de ativistas por expor negros como objetos.

“Dessa programação ampla de 34 espetáculos, 15 grupos/artistas estariam em diálogo direto com os artistas locais, em um projeto que denominamos ‘Grupo a Grupo’, no qual um grupo convidado e um grupo local, de forma a incentivar a convivência e co-criação, que poderia incluir desde bate-papos até trabalhos sobre rascunhos de cena. Esse resultado ficaria a cargo do diálogo construído por estes grupos e se apresentaria na Casa FIT, e acreditamos que esse encontro poderia reverberar em espetáculos futuros”, comenta Bagagal.

A Casa FIT é uma proposta nova dos curadores, prevendo um espaço para encontros, homenagens e ações formativas. Quanto ao Intercena, projeto criado na edição 2014 para promover a internacionalização dos grupos locais, não há sinalizações. “Acho que a ideia do Intercena não foi descartada, apesar de não ter sido plenamente desenvolvida. Tenho minhas dúvidas sobre a pertinência dessas feiras de teatro, mas, para que elas existam efetivamente, precisam ser bem articuladas. Não adianta nada trazer programadores de festivais irrelevantes e sem importância. É preciso priorizar a qualidade em detrimento da quantidade”, comenta Moreira.

Viagens. Em nota, a FMC registra que os curadores realizaram 13 viagens para a seleção de espetáculos, sendo dez internacionais e três nacionais. Embora Eduardo Moreira e Diego Bagagal afirmem que as viagens tenham sido estratégicas e que foi possível incorporar à grade trabalhos artísticos dos cinco continentes, as visitas a festivais se concentraram na Europa, em países como França, Escócia, Inglaterra e Portugal, e, no Brasil, foram visitadas as capitais Rio de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre. Países latino-americanos não foram visitados, ao contrário do que havia sido divulgado no início do ano.

Ainda consta na carta de renuncia dos curadores que foram assistidos 200 espetáculos dos quais, pelos menos, 120 foram vistos presencialmente. “As viagens enumeradas na carta foram feitas pelo Diego e por mim. É claro que, se tivéssemos tido oportunidade de fazer outras viagens, teria sido melhor e mais completo, mas não houve dinheiro e agenda para tal. Acho, sinceramente, que conseguimos montar uma boa proposta a partir de alguns festivais estratégicos”, responde Moreira.

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15/10/2015 TAGS: Curadoria, FIT-BH BY: Daniel Toledo
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Arte, crítica e promiscuidade

Arte, crítica e promiscuidade

— por Daniel Toledo —

 

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Higgs - Art Isn't Easy

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Introdução à promiscuidade

  1. Característica do que é promíscuo
  2. Mistura confusa, desordenada.
  3. Relacionamento não monogâmico, com muitos parceiros diferentes.
  4. Convivência muito próxima com pessoas de todo tipo.
  5. Relacionamento não regido por leis ou regras.

Careta que às vezes sou, reconheço que demorei um pouco para entender e aceitar que poderia trabalhar como artista e crítico de artes numa mesma vida. Com o tempo, no entanto, venho percebendo e realmente acreditando que essa promiscuidade faz sentido e é uma resposta aos nossos tempos, que parecem mesmo superar qualquer tipo de separação entre a pesquisa, a criação e a crítica.

Essa separação me parece estar relacionada a um projeto moderno sobre o fazer artístico e os fazeres em geral – e aqui eu me refiro a este projeto moderno em seu contraste com o contemporâneo, com aquilo que se consolida, não só nas artes cênicas mas também em outros campos artísticos, como as artes visuais, a partir dos anos 1960. Foi principalmente a partir de então que se intensificaram uma série deslizamentos dentro do campo das artes visuais, e que se tornou mais difícil, por exemplo, distinguir arte e vida, arte e política e, por quê não, arte e crítica.

Esse paralelo com as artes visuais, aliás, é algo que costuma permear o meu pensamento, porque além de ser promíscuo ao combinar as funções de criador (de artista) e de crítico, eu também sou promíscuo ao atuar como crítico de artes cênicas e de artes visuais – sendo as artes visuais o meu campo de origem em relação à crítica de artes. Antes de acompanhar festivais e produzir críticas de teatro, escrevi sobre exposições para um jornal, publiquei perfis de artistas, escrevi alguns capítulos de livros de artistas, assim como acompanhei como crítico programas de residências de artes visuais e performance.

Percebo então que, numa comparação entre os dois campos, a palavra, matéria fundamental da crítica, é certamente mais presente no teatro do que nas artes visuais, geralmente mais silenciosas do que as artes cênicas. E por isso, talvez, o campo das artes visuais tenha uma relação mais madura, menos conflituosa com a ideia de mediação, em geral. Enquanto é bastante comum que programas de residência artística e exposições de artes visuais tragam, em seus catálogos ou paredes, textos assinados pelos próprios artistas ou por críticos convidados, é mais raro que o programa de um espetáculo inclua entre seus elementos esse tipo de mediação textual. Mas nós podemos pensar que o teatro não é uma coisa simples, e que nem tudo o que interessa ao espectador está dado de cara a esse mesmo espectador, dentro da própria obra.

 

As artes da crítica

Me parece interessante e inspirador, então, aproximar a função do crítico a algumas funções do dramaturgo e do dramaturgista citadas pelo pesquisador Henry Thorau no livro “Perspectivas do Moderno Teatro Alemão”, lá em 1984. Naquele momento, Thorau havia deixado há pouco as funções de diretor artístico e dramaturgista do Teatro Freie Volksbühne, em Berlim, onde, segundo o livro, uma das suas atividades correspondia a organizar algumas campanhas de esclarecimento dos espectadores em relação as estreias do teatro. Essas campanhas aconteciam por meio de visitas a organizações de espectadores que existem por lá, fazendo algo que ele chama de “palestras de informação e introdução às montagens”, e respondendo muitas vezes às críticas que alguns espectadores faziam aos espetáculos, já depois de assisti-los.

Outra função assumida pelos dramaturgos no mesmo teatro era justamente fazer os programas dos espetáculos que assinavam. Esses programas são definidos pelo Thorau como “complementos teóricos dos espetáculos, a nível histórico e filosófico” e chegavam, às vezes, a ter cem páginas ou mais. Considerando que cada espetáculo do teatro era visto por uma média de 20 mil pessoas (50 sessões com 400 espectadores), os programas costumavam alcançar tiragens entre 15 e 30 mil exemplares.

Penso que pode ser interessante ver a crítica, a mediação, como uma forma de reflexão, de pensamento a partir de uma obra, e não como uma opinião ou um julgamento sobre essa obra. Mais do que avaliar um trabalho, cabe ao crítico se deixar vibrar por este trabalho e traduzir em palavras essa vibração, como quem dá vazão a uma reflexão que tem a peculiaridade de ter sido despertada a partir de uma experiência artística. Daí a aproximação entre a ideia de crítica e a ideia de ensaio – o qual pode ser criativo e que pode combinar elementos narrativos, contextuais e reflexivos, entre outros.

Voltando ao contexto teatral alemão, além de funções relacionadas à mediação entre a obra e o público, ao mesmo dramaturgista são atribuídas responsabilidades bastante específicas em relação aos artistas e seus processos de criação. Uma dessas funções, conta Thorau, parece se aproximar do que costumamos chamar, hoje, de crítica cúmplice: a crítica que se direciona ao processo de criação, por vezes interferindo nesse processo, e não mais somente ao produto artístico “finalizado”. Em uma palestra que o pesquisador fez recentemente na SP Escola de Teatro, ele se referiu ao dramaturgista como uma espécie de crítico interno da encenação. Ele também se refere ao dramaturgista seria um crítico contextualizado, um pesquisador de documentação em torno da obra e estudioso das articulações dos sentidos do texto.

Todas essas atividades citadas pelo Thorau parecem se aproximar bastante da atividade crítica desempenhada por cada um de nós, como críticos, com a diferença de que nós não contamos, no Brasil, com um sistema cultural em que seja recorrente que teatros, instituições culturais, coletivos de artistas ou criadores teatrais incorporem críticos aos seus corpos de colaboradores fixos. E me parece haver, aí, um espaço a ser cada vez mais ocupado e reivindicado no campo contemporâneo das artes cênicas e das artes em geral.

 

A crítica como arte

Lembro, então, da pesquisadora Josette Féral, que defende a importância da crítica e a necessidade de se reconhecer, entender e praticar a crítica como uma arte. “A complexidade da crítica está relacionada às demandas contraditórias que são impostas ao crítico. Sua arte é originalmente uma arte ofensiva, mas também é uma arte da solidariedade, uma solidariedade com a classe artística, com o público, com a sociedade; ela faz do crítico um ‘cúmplice da aventura do teatro, um parceiro criativo’. Ela é também uma arte do diálogo: um diálogo com a obra de arte, com o artista, com o público”

O que entendo como possível síntese dessa aproximação entre as atividades do artista e do crítico é justamente a superação da lógica moderna que separa cada coisa em seu lugar, como se uma pessoa só pudesse desempenhar uma atividade ao longo da vida, ou só pudesse ocupar um lugar dentro de um mesmo sistema. Nesse caso específico, o que propomos, acredito, é uma aproximação entre saberes e fazeres, ideia que está organizada no seguinte trecho do “O Crítico Ignorante”, de Daniele Avila Small.

“Existe um saber na construção de uma obra, mas ela se define mais como um fazer. E há um fazer na crítica, mas ela se define mais como um saber. A aproximação da crítica de teatro poderia enfatizar a dimensão de fazer da crítica, separando-a do que remete a um saber: menos avaliar e corrigir, mais relatar, adivinhar, traduzir, verificar. E talvez fosse possível também aproximar a natureza do fazer da crítica da natureza do fazer da arte: trabalhar o abismo entre um sentimento e a expressão desse sentimento”.

Como forma de apontar uma utopia para a crítica, vou um pouco mais longe e cito alguém que não está na mesa: o Baudelaire. “Creio sinceramente que a melhor crítica é a divertida e poética; não essa outra, fria e matemática que, sob o pretexto de explicar tudo, carece de ódio e de amor, despoja-se voluntariamente de todo temperamento. Se um quadro – ou uma peça de teatro – correspondem a natureza refletida por um artista, esse mesmo quadro deve ser refletido por um espírito inteligente e sensível. Assim, o melhor modo de dar conta de um quadro poderia ser um soneto ou uma poesia”.

(Texto escrito para a mesa “Crítica de Artista”, realizada no dia 24 de agosto de 2015, dentro do Colóquio DocumentaCena, na programação do Festival Internacional de Teatro Cena Contemporânea, em Brasília. Integrantes da mesa: Daniele Ávila Small, Daniel Toledo, Sérgio Maggio e André Luís Gomes. Mediação: Luciana Hattmann)

 

Referências

BAUDELAIRE, Charles. ¿Para qué sirve la crítica? Fragmentos del Salón de 1846. Em: Pequeños poemas en prosa, Crítica de arte. Buenos Aires: Espasa-Calpe Argentina.

FÉRAL, Josette. A obra de arte julga: o crítico no cambiante cenário teatral. Tradução de Daniele Ávila Small. Em: New Theatre Quarterly (NTQ 64, VOL XVI, PART 4).

SMALL, Daniele Ávila. O Critico Ignorante: uma negociação teórica meio complicada. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2015.

THORAU, Henry. Perspectivas do moderno teatro alemão. São Paulo: Brasiliense, 1984.

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06/10/2015 TAGS: Crítica de Teatro, política cultural BY: Daniel Toledo
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A estética negra ressignificada no espetáculo “Madame Satã”, do Grupo dos Dez

A estética negra ressignificada no espetáculo “Madame Satã”, do Grupo dos Dez

— por Marcos Antônio Alexandre (Faculdade de Letras – UFMG/CNPq) —

Crítica sobre o espetáculo Madame Satã, do Grupo dos Dez (MG).

Qual é o espaço do negro e da sua cultura na sociedade brasileira? Existe uma instância de representação do discurso enunciado pelos negros? Qual o lugar do teatro negro na nossa contemporaneidade?

Em tempos de debates e discussões sobre os distintos discursos que vêm sendo invisibilizados nos grandes centros hegemônicos de representação, não posso deixar de fazer alusão à recente onda de protestos, veiculados nas redes sociais e motivados pela apresentação do espetáculo A Mulher do Trem, da Cia Os Fofos Encenam. A peça foi cancelada porque membros do Movimento Negro se sentiram indignados com a presença, na montagem, de duas personagens que faziam uso do blackface. O espetáculo é realizado desde 2003 e, no momento de seu cancelamento, integrava a programação do mês de maio do Itaú Cultural de São Paulo.

Muito se discutiu sobre a questão do preconceito, sobre o porquê da discussão, uma vez que o espetáculo vem sendo apresentado há anos e só agora tais aspectos foram questionados. A polêmica ganhou uma dimensão tão abrangente que o Itaú Cultural resolveu promover um debate aberto [1] com a participação de artistas e ativistas do movimento negro, entre eles participaram Fernando Neves (diretor de Os Fofos Encenam), Eugênio Lima (dj e ator), Sthepanie Ribeiro (blogueira), Dennis Oliveira (Coordenador Quilombação) Roberta Estrela D’alva (atriz) Salloma Salomão (Cia Os Crespos), Aimar Labaki (dramaturgo), entre outros ativistas e membros da sociedade civil interessados na discussão. Neste debate, vários questionamentos foram feitos sobre o papel do teatro na sociedade, o papel do negro e da sua cultura em nosso contexto e se questionou sobre a relevância de, em pleno século XXI, ainda fazer uso da técnica de pintura do rosto de um ator branco (ou não) com tinta preta para “representar” um sujeito negro. Os negros não são capazes de representarem a si mesmos ou qualquer outra personagem? Fomentar o estereótipo? Ridicularizar a figura do negro? Provocar e incitar o humor a partir da exposição caricatural dos afrodescendentes? Vários pontos de vista foram trazidos para discussão, e o aspecto positivo de toda esta “cena” – que, em princípio não deveria fazer parte de nosso cotidiano, mas muito necessária justamente pelo contexto e histórico de segregação e de preconceitos ainda vividos pelos negros na nossa contemporaneidade – foi o fato de a sociedade se mobilizar, reivindicando o seu lugar de fala, de debate e discussão.

O motivo de retomar brevemente esta polêmica passagem em que se envolveu a Cia Os Fofos Encenam é para trazer para discussão o trabalho do Grupo dos Dez [2], coletivo mineiro formado por um elenco majoritariamente negro [3], que se dedica à pesquisa sobre propostas espetaculares de teatro musical tipicamente brasileiros. Com base nestes princípios artísticos, o grupo concebe “Madame Satã”, peça que estreou em 23 de janeiro de 2015, na Programação da 9ª edição do VAC – Verão Arte Contemporânea e como resultado da equipe de trabalho selecionada para a 17ª edição do projeto Oficinão Galpão Cine Horto 2014.

Madame Satã

Madame Satã

Madame Satã

Madame Satã

Madame Satã

Madame Satã

Madame Satã

Madame Satã

Na concepção de “Madame Satã”, o Grupo dos Dez se vale da biografia de João Francisco dos Santos (Glória do Goitá, 25/02/1900 – Rio de Janeiro, 11/04/1976) – personagem emblemática da vida noturna marginal carioca, filho de Manoel Francisco dos Santos e Firmina Teresa da Conceição, criado numa família de dezessete irmãos e que, segundo a sua biografia, chegou a ser trocado pela mãe, quando criança, por uma égua –, fazendo-a dialogar com histórias de outras personagens marginalizadas e, por sua vez, invisibilizadas, suscitando, assim, apontamentos que permitem que os espectadores possam refletir sobre questões que perpassam a crítica contra o racismo, a homofobia, a lesbofobia, a misoginia, a transfobia e o machismo. Para levar à cena a leitura da vida de Madame Satã, o grupo utiliza como referência a corporeidade das danças afro-brasileiras, em especial a capoeira e a dança dos Orixás. O espetáculo tem direção de João das Neves, codireção de Rodrigo Jerônimo, direção musical de Bia Nogueira e dramaturgia de Marcos Fábio de Faria e Rodrigo Jerônimo, com várias composições musicais autorais de integrantes do grupo.

“Madame Satã” sobressai por apresentar ao público uma montagem legitimamente concebida dentro da estética do teatro negro. Conceitualmente, o espetáculo trabalha com os cinco pontos propostos pelo pesquisador Eduardo de Assis Duarte, em seu artigo “Por um conceito de Literatura Brasileira” [4], para a leitura da literatura afro-brasileira, e com os quais busco estabelecer diálogos para análise da cena negra produzida no Brasil, a saber: “temática”, “autoria”, “ponto de vista”, “linguagem”, “público”.

O fato de resgatar a biografia de Madame Satã já evidencia que há um cuidado em trabalhar de forma incisiva com a “temática” negra. As personagens remetem ao universo da boemia, a uma casa de prostituição do baixo meretrício da região da Lapa ou de qualquer centro urbano: além de Madame Satã, uma cafetina, Catita, várias prostitutas – e uma travesti, Primorosa. Este aspecto é trazido para cena desde o início da representação, onde os atores/personagens ocupam o espaço urbano. Um bar simples, sediado ao lado do Galpão Cine Horto, se converte em o “ambiente decadente” que é ocupado por cantores, malandros, putas, ou seja, as personagens marginalizadas que serão retratadas nas cenas. O centro urbano é ressignificado, propondo uma dramaturgia do espaço que passa a ser reocupada pelas personagens marginalizadas e o público, que se divide entre assistir a performance dos atores/personagens, escutar as músicas – instaura-se uma roda de samba e aquele espectador mais animado não deixa de cantar e dançar –, tomar uma cerveja enquanto o “teatro” ainda não começa. Na realidade, a quarta parede já foi rompida e tudo já integra o jogo espetacular. A cafetina interage com o público e incita a suas meninas a circularem pelo espaço para ganhar a vida, e elas tomam conta do entorno do Galpão Cine Horto, invadem e interrompem o trânsito local, parando carros, mexendo com os motoristas. Catita se dirige a alguns espectadores apresentando o “material” que tem para oferecer, chama a atenção daquelas “meninas” que não estão se dedicando à função: “Ei, bonitinha, tá achando só porque é estrangeira pode ficar aí parada? Já falei para não dar ideia para malandro que não paga. (Para o malandro – algum homem presente) E você, tá olhando o que. Vaza! Deixa minha menina trabalhar.”.

Nesta profusão de cenas entrecortadas e que se complementam, em meio à bebida, à roda de samba, à diversão, em certo momento, uma moto barulhenta e em alta velocidade para nas imediações da entrada do Cine Horto e um motoqueiro dá uma alvejada de tiros em Primorosa, a travesti. O público é convidado a adentrar ao espaço de representação, deixando o corpo daquele sujeito estirado no chão: cena que produz um déjà vu ao olhar do espectador mais atento.

A temática das personagens marginalizadas continua sendo evidenciada nas histórias paralelas que integram a dramaturgia do espetáculo. Durante o desenvolvimento da peça, outros “tipos sociais” integram a trama: Alberto, um policial preconceituoso, com um discurso repleto de ironia e uma linguagem de baixo calão, que é morto por Madame Satã; presidiários, que representam os sistemas carcerários brasileiros, com a ideia de superlotação ou cenas de violação sexual – referência à cena de estupro de um prisioneiro em Ilha Grande ou em qualquer outro centro carcerário brasileiro; homens que frequentam a zona; um grupo de retirantes que personifica o momento em que, para continuar sobrevivendo à aridez do sertão, a mãe Firmina vende o menino João ao Sr. Laureano, um domador e criador de cavalos, em troca de uma égua; um grupo de reacionárias que incita a plateia com discursos politicamente incorretos, fazendo com que o publico ria, num primeiro momento, mas logo se cale, devido ao tom e força dos discursos.

REACIONÁRIA 1: Muito bom, esses nordestinos vem para o sudeste montar favela aqui, deixar tudo uma zona. Pena de morte para os Nordestinos…

TODAS: Isso mesmo, bravo!

[…]

REACIONÁRIA 3 : Deixa eu falar uma coisa: estou cansada desse negócio de neguinho ter “privilégios” tirando os meus privilégios. Eu estudo como uma louca para dar conta e vem neguinho e rouba minhas vagas com essa tal de cota. Abaixo as cotas raciais. Meritocracia já.

TODAS: Meritocracia já!

[…]

REACIONÁRIA 5: E digo mais, esse bando de preto que só sabe roubar. Tem que ficar preso mesmo. Tem que ter prisão perpétua. Bandido bom é bandido morto. (Para o público) Ficou com dó, minha senhora, adota e leva pra casa.

REACIONARIA 6: E esse monte de bolsa que existe, minha gente? E bolsa tudo. Bolsa família, bolsa tênis, bolsa favela. Agora inventaram uma tal de bolsa família de presidiário… E minha família, que bolsa que eu tenho? Eu pago os meus impostos e se me ferro.

Os questionamentos trazidos para cena buscam extrapolar o espaço de representação dramatúrgica/ficcional, atingindo o espectador com aspectos incisivos em relação ao contato com o Outro no contexto de enunciação brasileiro, no qual os sujeitos marginalizados continuam sendo invisíveis aos olhos dos políticos e de grande parte da sociedade como um todo, que prefere não ver ou discutir sobre as alteridades que nos confrontam. Sem sombra de dúvida, muitos poderão dizer que o espetáculo é panfletário e/ou militante, mas é exatamente este lugar de fala que a abordagem temática busca trazer para discussão, pois se esta fosse uma questão resolvida em nossa sociedade, certamente não estaria ainda sendo discutida. Esta assertiva pode ser corroborada, por meio das palavras de uma das atrizes do elenco, Laís Lacorte [5], que, ao fazer referência à sua participação na peça, argumenta que:

“Durante todo o processo de montagem deste espetáculo, tive a oportunidade de aprofundar minhas reflexões acerca de todos os temas que a peça aborda, por meio de discussões que surgiam durante o processo de montagem. Compreendi ainda melhor o meu lugar dentro da esfera social enquanto mulher, negra e favelada, e constatei o quão importante é ter um teatro que se proponha a falar sobre tais discussões, revi assim a relevância do papel social e político que o teatro exerce”.

Os argumentos da atriz se justificam não só por demonstrarem o seu processo de construção identitária, como também por legitimar a força e a importância das reflexões suscitadas pelo processo da montagem e que são apresentadas para que os espectadores possam colocar em cheque as suas considerações e inquietações.

Assim como a “temática” é bem sucedida para corroborar a proposta estética de trabalho com o teatro negro concebido pelo grupo, em “Madame Satã”, a “autoria”, o “ponto de vista” e a “linguagem” também o são. O texto dramático é concebido por autores negros e que têm identificação com os aspectos socioculturais relacionados com o negro; o ponto de vista interno retrata os lugares de fala e as mazelas enfrentadas por esses sujeitos/personagens, e os autores e atores envolvidos na montagem têm a preocupação de trazer para as cenas cada personagem crivada pela linguagem que lhe é peculiar. A linguagem é corporificada cenicamente, ou seja, cada sujeito representado é retratado com a linguagem que resgata o seu lugar de enunciação: o malandro, as putas, a cafetina, o policial, todos trazem um discurso peculiar em que se tem o cuidado de resgatar as gírias, as tonalidades, os registros de falta de cada sujeito representado. Chama atenção, a título de exemplo, o discurso homofóbico e repleto de preconceito do policial Alberto, cena em que se revive o momento em que Madame Satã é detido e enviado para a Ilha Grande, pelo seu assassinato:

“Esses veado têm tudo que morrer; Veado; Veado; Psiu, ô, veado; Eu tô falando é com você! É! Você! Eu tô falando é com você mesmo seu veado! Calma gente, tá tudo bem! Eu sou da Guarda Civil. Eu só preciso ter um conversa com o… João Francisco dos Santos? Com o veado aqui! Arrombado, bicha, bambi, boiola, boneca, gazela, maricas, morde-fronha, mama-rola, queima-rosca! ARTISTA!? Então quer dizer que você é artista? 28 anos. Sua profissão: AR – TIS – TA. Artista é o caralho! Artista de dar a bunda! Você não tem vergonha de sair por aí vestido desse jeito não? ‘A Casa de Sapê tem o orgulho de apresentar a travesti sambista… Travesti sambista!?’ Vejam só!!! ‘A Mulata do Balacochê!!!’ Você não tem vergonha de sair por aí rebolando o cu desse jeito? […] No meu tempo, o sujeito transviado, a gente curava com surra de vara de marmelo. E digo mais! Digo mais! Desculpe, mas aparelho excretor não reproduz! É feio dizer isso, mas… Dois iguais não fazem filho! Pra mim quem defende o homossexualismo, defende uma doença e defende o fim da humanidade! Prove-me o contrário! […] Tu acha que essa fantasia esconde o que você é? Veado escroto! Veado, vagabundo e proxeneta, é isso que você é! Ou tu some daqui agora com essas suas preta fedida, ou tu vai levar umas porradas nessa sua cara preta! Aqui não tem lugar pra você não seu veado imundo! Aqui na Rua do Lavradio, veado não pisa! Eu sou o responsável pela Lapa, e no meu pedaço bicha não tem vez! Xibungo de merda! Sua bicha passiva, asquerosa”

Esteticamente, vale a pena ser destacado o fato de o grupo se propor a realizar um teatro musicalizado em que as ações dramáticas, as histórias e os relatos trabalhados ao longo do desenvolvimento do espetáculo são interconectados pelas “histórias” das personagens. Destaca-se a qualidade do elenco, no qual todos envolvidos demonstram ter uma excelente domínio vocal e aptidão para tocar instrumentos de corda, sopro ou percussão. Há uma sincronia nas vozes das atrizes/putas e dos atores (coro – Madame Satã) que reforça, muitas vezes, os espaços de ambiência retratados nas cenas, a casa de putas e a movimentação existente no bordel, as atrações musicais que fazem daquele lugar um ponto de encontro de sujeitos invisibilizados.

Outro aspecto que reforça a estética negra é a corporeidade dos atores em cena. Salta aos olhos o uso do corpo não só como uma instância de representação e execução de uma partitura física, mas como uma possibilidade de resgate de um lugar de memória. Nesta perspectiva, chama atenção a ideia da direção de utilizar três atores para representar momentos distintos da vida de Madame Satã. Os atores Denilson Tourinho, Evandro Nunes e Rodrigo Ferrari dão vazão a nuanças distintas de passagens da vida da personagem. Cada um imprime, a sua maneira, uma corporeidade à personagem. Tourinho se destaca em uma das cenas como a Mulata do Balacochê, a travesti sambista que é a grande atração da Casa do Sapê, o bordel de cafetina, Catita. O ator executa uma performance em que cada ação física e gestual se mescla com uma dança-ritual proposta para desvelar as particularidade do jogo de dubiedade inerente à personagem: homem x travesti, delicadeza de movimentos x exaltação da virilidade e do tônus muscular, sedução e encantamento da plateia. Por sua vez, Rodrigo Ferrari, revive Madame em outra cena em que interpreta uma canção na qual se nota mais uma vez uma corporeidade do ator que nos remete ao corpo híbrido da personagem – negro, pobre, homossexual, nordestino, travesti –, o gestual do ator e a sua relação com o rito são evidenciados, demonstrando a incursão pela pesquisa da dança dos Orixás e do jogo da capoeira. Por fim, Evandro Nunes traz para a cena outra corporeidade da personagem: o malandro, um Zé Pelintra que cruza pelas encruzilhadas e marca os espaços com o seu corpo-presença, o malandro que apresenta uma destreza nos passos do samba, que joga com o corpo, que sinuosamente desvia entre os movimentos de capoeira e o rastro de uma energia corporal que é evidenciada em cada passo mediado pela dança-ritual proposta pelo ator/personagem. Trazer três Madames para a cena ratifica a potência da personagem, que se multiplica por meio da corporeidade de cada ator. Esta corporeidade, por sua vez, potencializa também a dramaturgia proposta, estabelecendo o jogo entre o textual, a linguagem e a dramaturgia de cada personagem. Isso pode ser verificado, por exemplo, na cena que antecede à prisão de Madame Satã por ter matado o policial Alberto, depois de ser ofendido pelo mesmo de forma degradante e preconceituosa, como já foi evidenciado.

(Madame Satã ergue o braço como se houvesse um arma em sua mão e aponta para o rosto de Alberto. Atira!)

MADAME SATÃ (As três madames dão o texto alternando entre elas): Que esse ferro que tomou todo meu braço, engoliu alguma razão. De vergonha e de ódio, de aquilo que não tem nome. Desgraça. Esse safanão que me acordou em um amontoado de bostas e merda que é, para sempre agora, minha vida. Minha pessoa estava linda. Seu desgraçado. Minhas pessoa era artista, seu desgraçado. Minha pessoa era gente, seu desgraçado. Minha pessoa era, seu desgraçado. E eram seus, aqueles olhos de besta, feroz. Roubou tudo que minha pessoa nunca teve. Era uma hora de felicidade. A bala caminhou em direção de duas desgraças.

Por fim, não posso deixar de comentar a singularidade do texto com o qual o grupo busca a formação de um “público leitor” por meio de sua proposta espetacular. Percebe-se o desejo de fazer do espectador coparticipe de cada ação que vai sendo corporificada pelos atores/personagens. A ideia é que a plateia não saia ilesa do espetáculo, que cada sujeito ali presente possa mediar a sua enunciação com o lugar de fala proposto cenicamente. Diante de tudo, fica latente a cena final em que os atores/personagens são divididos em pares héteros e homossexuais, onde se propõe um momento de encontro amoroso entre eles. As personagens entram em uma espécie transe, cantam baixinho uma incelença que culmina com o discurso, em forma de prédica, de Primorosa. Palavras que recuperam, ressignificam e contextualizam a de oração do Pai Nosso:

“Pai nosso que estais no céu. Muitos são aqueles que falam a oração de seu filho em vão. Repetem seu nome, mas perseguem o seu semelhante. Quando ensinaste, ó pai, que sem amor não poderíamos chegar ao seu reino, não aprenderam que matar e perseguir são práticas de ódio. Como fazem a sua vontade ao dizer que são mais retos que outros? O pão de cada dia é somente para seu próprio sustento e oferecem o pão envenenado aos que amam de maneira distinta. Pedem perdão às ofensas e seguem ofendendo aos seus semelhantes. De suas palavras sagradas, ó pai, recortam o que lhes interessam para justificar a morte. Pai, eles se sentem ofendidos por uma vida que não lhes pertence e sempre apontam atos alheios como pecaminosos. Pai nosso que estais no céu, santificam o seu nome em favor do acossamento e justificam o ódio que alimentam em seu nome pecando pela injúria e castração do livre arbítrio de seus irmãos. Pai nosso que estais no céu, eles criam falsos testemunhos, levantando o dedo para castrar os direitos dos outros. Ó pai, eles dizem todos os meus pecados e dizem serem os filhos mais amados. Pai nosso que estais no céu, perdoe-me pelos pecados que eles dizem que cometi. Quando peco por amar, quando peco por existir. Pai nosso, esse ódio é o que promove o meu medo e, assim, ó pai, sofro pelo ódio que é praticado em seu nome. Esse mesmo ódio que decreta ser todas as horas a hora da minha morte. Amém”

Estas palavras cortam, buscam atingir as memórias – pessoais e coletivas – e as identidades dos sujeitos que estão à margem do discurso e de todas as “benesses” possibilitadas pelas sociedades ditas globalizadas, fazendo-as dialogar (ou pelo menos buscando esta relação) com a enunciação de todos os presentes no teatro. A ideia é que as palavras continuem ecoando e tudo isso é reforçado com uma solução cênica em que se retoma o começo da proposta espetacular, demonstrando que os discursos aí presentificados permanecem latentes, sem respostas e que cada espectador deve vivificá-los à sua maneira:

(As luzes do teatro se apagam. Todos os personagens saem de cena. De repente, o motoqueiro da cena da rua volta. No palco, somente a Primorosa está em cena, no escuro. Com o farol da moto, o motoqueiro ilumina o personagem, que, assustada, tenta fugir. O motoqueiro dá três tiros na personagem, que fica caída em cena. Há um curto foco de luz nela, morta no chão. Todas a luzes se apagam)

 

[1] O debate pode ser conferido na íntegra no link: https://www.youtube.com/watch?v=LG_cRXBsKfE.

[2] O grupo nasceu em 2008 como um desdobramento das pesquisas realizadas pelos artistas João das Neves, Titane e Irene Ziviane, que são uma espécie de mentores do grupo. Em seu currículo, o grupo apresenta os seguintes trabalhos: Sagas no país das Gerais, direção de João das Neves e direção Musical de Titane; Evangelho bárbaro, direção de Elisa Santana e direção musical de Marcelo Onofri; e Madame Satã.

[3] Alysson Salvador (substituído, na segunda temporada, por Guilherme Ventura), Bia Nogueira, Daniel Guedes (substituído por Débora Costa), Denilson Tourinho, Evandro Nunes, Flor Bevacqua, Gabriel Coupe, Julia Dias, Kátia Aracelle, Laís Lacôrte, Nath Rodrigues, Rodrigo Ferrari, Rodrigo Jerônimo, Thiago Amador.

[4] Disponível em: http://150.164.100.248/literafro/ (link: Artigos).

[5] Atriz do grupo e discurso expresso em seu artigo intitulado “Diário de uma favelada: Relatos sobre o percurso criativo do espetáculo Memórias de Bitita – O Coração Que Não Silenciou”, escrito como parte de Trabalho de Conclusão de Curso do Bacharelado em Teatro da EBA – UFMG.

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16/09/2015 TAGS: A Mulher do Trem, Grupo dos Dez, João das Neves, Madame Satã, Os Fofos Encenam, Rodrigo Jerônimo, Teatro negro, VAC BY: Daniel Toledo
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Tão comum quanto extraordinária

Tão comum quanto extraordinária

— por Daniel Toledo —

Crítica de “Jacy”, do Grupo Carmin (RN).

Muito se fala sobre o crescente envelhecimento da população brasileira e seus desdobramentos sociais, mas pouco se escuta sobre as experiências de vida daqueles que, em meio a tempos que celebram a eterna juventude, já ultrapassaram a marca dos 60 anos. Interessados em tratar da velhice como tema de uma criação artística, os integrantes do Grupo Teatro Carmin, de Natal (RN), encontraram na trajetória de Jacy, uma mulher comum, nascida em 1920 e falecida em 2010, um caminho bastante frutífero para revisitar, de modo ao mesmo tempo crítico, poético e bem-humorado, quase um século de história do país e de seu povo.

Primeira aproximação do grupo em relação ao universo do teatro documentário, o espetáculo “Jacy” foi criado após consistente pesquisa em torno da personagem e de seus contextos de vida. “Descoberta” a partir de uma frasqueira abandonada na rua, ela é trazida à cena pelos atores Quitéria Kelly e Henrique Fontes, que, diante do público, reconstroem a trajetória de Jacy alternando-se com segurança e leveza entre registros dramáticos, narrativos e performáticos de atuação.

Jacy, do Grupo Carmin

Jacy, do Grupo Carmin

Jacy, do Grupo Carmin

Jacy, do Grupo Carmin

Jacy, do Grupo Carmin

Jacy, do Grupo Carmin

Jacy, do Grupo Carmin

Jacy, do Grupo Carmin

Ao longo do espetáculo, que conta ainda com intervenções em vídeo de Pedro Fiúza, a personagem se revela tão interessante por suas singularidades quanto por suas características mais ordinárias, as quais remetem a experiências e percepções certamente comuns a uma geração que vivenciou importantes capítulos da história nacional. Cenário de boa parte dessa trajetória, a cidade de Natal também é apresentada ao público a partir de suas especificidades e suas características facilmente reconhecíveis em outras capitais brasileiras.

Pelos singulares olhos de Jacy, assistimos, por exemplo, à participação do Brasil na 2a Guerra Mundial. Distante da grande narrativa, entretanto, ela enxerga a guerra como um acontecimento capaz de movimentar a pacata Natal dos anos 1940, convertida em movimentada base aérea e naval do exército estadunidense. “Estou apaixonada pela guerra, me deu vontade de viver”, suspira a personagem, em uma das cartas lidas em cena.

Em passagens que reiteram o caráter político do espetáculo e a persistência histórica de questões ainda a serem enfrentadas pela sociedade brasileira, compartilhamos com Jacy alguns questionamentos sobre a instauração da Ditadura no país (“Será que com fardas e tanques se protege a liberdade?”), assim como somos lembrados, dessa vez a partir de um curioso exercício genealógico apresentado pelos atores, sobre as recorrentes ações entre amigos – e familiares – desde sempre praticadas no cenário político nacional.

É também com os olhos dela, que agora já começa a experimentar a velhice, que nos assustamos com a verticalização desenfreada das cidades brasileiras, cada vez mais propícias à solidão que progressivamente se estende da velhice a outras faixas etárias. É só depois de acompanharmos o “filme” de sua vida que temos, então, um comovente retrato da velhice de Jacy e podemos reconhecer, nesse retrato, as perdas que de modo implacável marcam a trajetória de qualquer pessoa que alcance tamanha longevidade.

E ainda que, no fim das contas, o interesse inicial pelo tema da velhice se veja imerso em outras discussões, é justamente a partir do trânsito entre a trajetória particular da nonagenária Jacy e uma história social compartilhada por todos nós que o espetáculo ganha complexidade, amplia seus sentidos e alcança um notável equilíbrio entre as dimensões afetivas e políticas da saga tão comum quanto extraordinária que lhe serve como eixo.

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24/08/2015 TAGS: Cena Contemporânea, documentário, Grupo Carmin BY: Daniel Toledo
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coberturas críticas

Personagens de si mesmos

Personagens de si mesmos

— por Daniel Toledo —

Crítica de “2+2=2”, de Rodrigo Fischer e Akmeteli Theatre (Brasil/Geórgia).

Seja no Brasil ou na Geórgia, país ex-soviético situado na instigante fronteira entre o Ocidente e o Oriente, as relações estabelecidas entre valores e culturas tradicionais e o que se costuma chamar de modernidade ou mesmo globalização cultural têm despertado, já há algum tempo, a atenção crítica de pensadores e criadores contemporâneos. Pois é justamente a essas relações que se volta o espetáculo “2 + 2 = 2”, produção realizada a partir de uma parceria entre o pesquisador e diretor brasiliense Rodrigo Fischer e artistas do Akmeteli Theatre, da Geórgia.

Nesta montagem, apresentada pela primeira vez no Brasil após estrear em março em Tbilisi, capital do país europeu, estão presentes elementos explorados pelo diretor em outras montagens, tais quais o uso intensivo da música e do vídeo, assim como uma encenação de caráter performativo marcada por atuações despojadas e frequentes interações com o público. Também se observa, em “2 + 2 = 2”, um uso bastante livre e criativo de letterings, que servem tanto para traduzir as falas dos atores quanto para introduzir breves narrações, comentários e questionamentos lançados diretamente ao público.

2+2=2, de Rodrigo Fischer

2+2=2, de Rodrigo Fischer

2+2=2, de Rodrigo Fischer

2+2=2, de Rodrigo Fischer

2+2=2, de Rodrigo Fischer

2+2=2, de Rodrigo Fischer

Conduzido por quatro atores – ou performers – e por seu próprio diretor, que permanece todo o tempo à beira do palco, de onde estabelece recorrentes diálogos com a cena, o espetáculo se estrutura a partir de uma dramaturgia fragmentada em que as questões perseguidas pela montagem são, aos poucos, e de modo nem sempre muito claro, trazidas ao palco.

Chamados sempre por seus próprios nomes, Andria, Sopho, Giorgio e Gigi se revezam, então, no protagonismo da cena, oferecendo ao público relatos aparentemente documentais nos quais expõem seus conflitos em relação a pulsos de tradição e modernidade que nem sempre lhes parecem confortáveis. A esses relatos, às vezes claramente cômicos, às vezes um tanto solenes, são articulados quadros musicais, coreográficos e audiovisuais que corroboram o tom performático da montagem.

O que se sugere a partir desses depoimentos, no entanto, parece ser uma divisão binária entre o tradicional e o moderno, desconsiderando, em certo sentido, a complexidade e as matizes dessa relação, em permanente negociação e inevitável deslizamento. Com isso, tanto as personas apresentadas no palco, quanto seus conflitos e as resoluções propostas para estes conflitos correm o risco de reproduzir – mais do que problematizar – os estereótipos a que pretendem criticar.

Tais estereótipos, aliás, são reforçados por algumas situações dramáticas que, paralelamente à composição performática de “2 + 2 = 2”, simulam diante do público o desenvolvimento de uma narrativa ficcional envolvendo os quatro atores, então convertidos em personagens um tanto simplificados de si mesmos.

Tendo em vista as reações da plateia, constantemente estimulada ao riso fácil e às palmas, o espetáculo parece funcionar na dimensão do entretenimento, apoiando-se em muitos momentos no virtuosismo e no despojamento de seus intérpretes, mas talvez não alcance, ainda, a problematização das questões que ambiciona compartilhar com o público.

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23/08/2015 TAGS: Akhmeteli Theater, Cena Contemporânea, Rodrigo Fischer BY: Daniel Toledo
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Uma história indelicada

Uma história indelicada

— por Daniel Toledo —

Crítica de “The Mother”, do Kropka Theatre (Polônia/Austrália).

Grosseira, alcoólatra e à beira da loucura. É com essas e outras palavras de semelhante calibre que se apresenta ao público a personagem central de “The Mother“, peça escrita em 1924 pelo dramaturgo polonês Stanislaw Ignacy Witkiewicz – ou simplesmente Witkacy. Àquela altura, a Polônia ainda sofria os efeitos da 1a Guerra Mundial, ao mesmo tempo em que celebrava cinco anos de independência após permanecer, por mais de um século, dividida entre os impérios russo, alemão e austríaco.

Mas enquanto uma onda de otimismo parecia tomar conta da nação recém-empossada, a peça de Witkacy, como se previsse a tragédia que viria apenas 15 anos depois, com a eclosão da 2a Guerra a partir da invasão da mesma Polônia por exércitos russos e alemães, traz à cena um quadro marcado pela deterioração afetiva de uma família para a qual o futuro parece muito pouco promissor. “O ser humano já não faz mais sentido”, repete a mãe, em diferentes momentos do espetáculo.

The Mother, Kropka Theatre

The Mother, Kropka Theatre

The Mother, Kropka Theatre

The Mother, Kropka Theatre

The-Mother_Foto_Rômulo-Juracy-8-e1440539320464

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Nesta montagem, assinada pela atriz polonesa Jolanta Juzskiewicz em parceria com o diretor tadjique Anatoly Frusin, todos os personagens são vividos pela mesma intérprete, que se apropria de elementos do texto, tais quais o alcoolismo, o uso de drogas e permanente ameaça da loucura, para transitar, sobretudo, entre os papeis da mãe, Nina, que conduz boa parte da peça, e de seu filho, Leon, qualificado pela própria mãe como inútil, idiota e sonhador – adjetivos ali tratados como equivalentes.

Se, nos primeiros instantes, a partir de uma visualidade quase escultural, a encenação se anuncia como uma espécie de instalação montada ante ao público, o texto de Witkacy rapidamente se converte no principal motor da cena, apresentando-se, de início, como um fluxo de pensamentos em voz alta que ressaltam a solidão da personagem. “Tenho certeza de que não há ninguém aqui”, afirma Nina, em uma de suas primeiras provocações ao público, constantemente desconcertado pelas irônicas observações da indelicada senhora.

Aos poucos, contudo, outros personagens são sugeridos, tal qual Leon, seu famigerado filho, e Dorothy, uma espécie de ajudante a quem Nina vez ou outra pergunta ou pede alguma coisa. O monólogo inicial passa a incluir, então, pequenos diálogos que atribuem complexidade à encenação e à relação da intérprete com o público, conquistando a cada instante novas camadas e novas possibilidades de fruição. “Talvez eu esteja morta”, sugere ela, em dado momento. “Talvez já esteja ficando louca”, pondera, algum tempo depois. “Ninguém sabe quem é”, sentencia, por fim.

Entre um gole de vodka e outro, Nina entoa alguns cantos católicos e conta encontrar no tricô o precário sustento da família, dando a ver alguns traços marcantes da cultura polonesa traduzidos em uma cenografia mínima, filiada ao chamado Teatro Pobre que, não por acaso, teve origem naquele país. Após deixar escapar desajustados traços relacionados ao próprio comportamento e à relação com o filho, ela pede desculpas ao público e atribui à própria história a perda dos bons modos. “As boas raças nunca ficam grosseiras”, observa, novamente entre o lamento e a ironia.

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22/08/2015 TAGS: Cena Contemporânea, Jolanta Juszkiewicz, Kropka Theatre, Polônia BY: Daniel Toledo
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O Horizonte da Cena é um site de crítica de teatro criado em setembro de 2012 pelas críticas Luciana Romagnolli e Soraya Belusi, em Belo Horizonte. Atualmente, são editores Clóvis Domingos, Guilherme Diniz e Julia Guimarães. Também atuam como críticos Ana Luísa Santos, Diogo Horta, Felipe Cordeiro, Marcos Alexandre, Soraya Martins e Victor Guimarães. Julia Guimarães e Diogo Horta criaram, em 2020, o podcast do site. Saiba mais

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