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Mirada IV – As máscaras e os afetos de “A Primeira Vista”

por Luciana Eastwood Romagnolli

“Nada é suficiente”, diz o adesivo na porta da geladeira. Se essa é uma afirmação pessimista ou previamente satisfeita, depende da perspectiva de quem a observa. Para a personagem de Drica Moraes, o sentido é negativo. Mas ela esconde o que pensa ao ouvir a leitura positiva feita pela semidesconhecida que recebe em seu apartamento – a atriz Mariana Lima.
Mais do que pontos de vista distintos, o espetáculo “A Primeira Vista” sublinha os caminhos de convergência e divergência até esse desconhecido que é uma outra pessoa – por mais afeto que se tenha por ela. Nesse trajeto, surgem as mentiras ditas quase sem querer nos primeiros encontros e as afinidades aos poucos reveladas, até que as personalidades estabeleçam um jogo particular de intimidade e confiança que interrompa a indiferença.
Estas são duas conquistas, confiança e intimidade, essenciais em cena também para além da ficção. Drica – em seu retorno aos palcos após um tratamento contra leucemia – e Mariana são dirigidas por Enrique Diaz, com quem elas têm uma história em comum. Kike namorou Drica e fundou, com ela, a Companhia dos Atores. Anos depois, casou-se com Mariana, que saía do Teatro da Vertigem, e passaram a trabalhar juntos. Obviamente, essas são informações extraficcionais sem as quais a montagem igualmente se sustenta, mas a cumplicidade entre os três é evidente e necessária no espetáculo, apresentado em Santos pelo Mirada – Festival Ibero-Americano de Artes Cênicas.
“A Primeira Vista” é a segunda peça do canadense Daniel MacIvor que Diaz dirige, e guarda semelhanças com “In on It”, a anterior, nos temas e modos de construção. Como no texto encenado pelos atores Fernando Eiras e Emílio de Mello, há um contraste entre as coisas mais comezinhas de um relacionamento, seja de amor fraterno ou sexual, que nutrem cena a cena, e a implacabilidade da morte pairando como tema suspenso sobre as duplas de atuantes.
O jogo com a representação, que em “In on It” criava três camadas de narrativa, persiste, agora, sob outra forma. As atrizes entram em cena como se não representassem personagens, buscando um registro de espontaneidade. “Como (se) faz uma pessoa, pessoa?”, indaga Mariana Lima no programa do espetáculo, confessando sua dificuldade em atingir uma aparente naturalidade. É fundamental para essa construção o modo como as duas atrizes entram em cena, estranham o palco e demonstram reconhecer o público. A situação de convívio teatral se evidencia ali, naqueles primeiros instantes, arrebanhando o espectador para tomar parte como testemunha consciente e destino último do endereçamento da fala delas.
O mais interessante é que essa atuação supostamente cotidiana e “sem máscaras” permite que o foco recaia sobre o quanto de representação há nas situações diárias reproduzidas pelas atuantes em cena e no modo como as pessoas se relacionam na vida pública e privada, construindo como que personagens de si mesmas, dramatizando humores e preocupando-se com a imagem que os outros terão delas. A armadilha está em restringir-se às formas etiquetadas (de afeto e sexualidade, no caso) que cada um determina para si e em relação aos outros.
Nesse jogo teatral que reproduz a teatralização da vida, Drica assume a personalidade de uma mulher mais exibida, hábil em ganhar a simpatia e o riso alheio (no caso, do público) e que os manipula com frases de efeito e maneirismos, enquanto Mariana evoca uma tímida, mais séria, e cujas abordagens são socialmente desastradas.  Em um palco nu, senão pelo fundo infinito todo rabiscado, elas inventam e desfazem tempos e espaços, servindo-se de poucos objetos e afetadas, sobretudo, por mudanças de luz e uma sonoplastia sugestiva que inauguram distintos ambientes de convívio.
Entre momentos pulsantes que captam sutilizas e ironias da trilha retraçada que as uniu e desuniu, o ponto dissonante talvez seja justamente o final, por sua ingenuidade fabular e necessidade otimista de conciliação – especialmente no epílogo. Mas, antes dele, o desfecho pode ser lido como metáfora da ameaça exterior ou selvagem que as espreita e consome.   
Espetáculo visto no 2º Mirada – Festival Ibero-Americano de Teatro de Santos, em setembro de 2012.
22/09/2012 TAGS: Daniel McIvor, Enrique Diaz, Mirada, Rio de Janeiro 0 COMMENT
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O Horizonte da Cena é um site de crítica de teatro criado em setembro de 2012 pelas críticas Luciana Romagnolli e Soraya Belusi, em Belo Horizonte. Atualmente, são editores Clóvis Domingos, Guilherme Diniz e Julia Guimarães. Também atuam como críticos Ana Luísa Santos, Diogo Horta, Felipe Cordeiro, Marcos Alexandre, Soraya Martins e Victor Guimarães. Julia Guimarães e Diogo Horta criaram, em 2020, o podcast do site. Saiba mais

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